quarta-feira, 16 de fevereiro de 2011

Germaine

É conhecida como a viúva Germaine. Não por se tratar do seu verdadeiro nome, que ainda ninguém conseguiu descobrir ao certo, mas pela necessidade de a tratar de alguma forma. Germaine por se acreditar ter vindo da Alemanha antes de se instalar naquela pacata aldeia, e porque Germaine é agradável e fica no ouvido. Perdera o marido e filho num acidente de comboio e vivera a partir daí tristemente só, entregue aos seus tecidos e olhos gastos negros. Costuma sair apenas de casa para ir ao merceeiro abastecer-se. No entanto foi vista naquela tarde no pequeno largo ajardinado que abraçava o coração daquele povoado, mostrando pela primeira vez compaixão e ternura por algo que não fossem velhas molduras poeirentas. Acompanhava um camponês. Ela muito composta, ele vestindo uns trapos encardidos enquanto transportava a seu lado uma bicicleta ferrugenta. Deixava alguns finos cabelos fugir do meticuloso penteado, aconchegado no seu chapéu, dançarem ao ritmo da brisa. A simplicidade daquele senhor intrigara-a e confortara-a pela primeira vez em anos. E dele se foi aproximando. Primeiro com passeios pelos campos onde este trabalhava, até começar a visitar o seu recatado casebre. E ali se refugiava. Experimentava secretamente o verdadeiro e caloroso prazer. Entregava o seu corpo e alma àquele modesto homem. Sentia finalmente o sangue fervilhar e percorrer cada milímetro do seu corpo, sentia a sua pele a reagir ao mais ínfimo estímulo, sentia o prazer que apenas a carne lhe poderia oferecer. E vibrava como nunca. As mãos gastas e rijas do camponês, os seus lábios gretados, a sua pele grossa e a sua robustez e brutalidade davam-lhe a conhecer um novo mundo. Uma nova concepção do que até então tomara por vida. E dali saía completa. Tal como ele. Quando os afazeres de cada um os obrigava a sair do refúgio. Ela acompanhada pelo toc-toc dos seus sapatos e ele pelo chiar da bicicleta. Fingiam desconhecer a “atrocidade”, como os demais gostavam de lhe chamar, que habitualmente se desenrolava naquele cenário. Calavam o pecado com o prazer e falsa inocência impregnados nos seus rostos. Esperando o próximo passeio pela seara, ou pelo mercado no centro da aldeia para esquecerem as implicações da idade e as regras da gente…Aliviados de si.

3 comentários:

  1. Desculpa..., mas estou surpreendida!
    E não, não estou de todo a dar uma de amistosa leitora...
    Quanto a mim, o melhor que aqui tens!
    Quer a nível de clareza, quer a nível de mensagem, quer a nível de articulações firmes, quer a nível da originalidade que é despretensiosa.
    Gostei. Muito!
    *

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  2. E reli! Bolas, que maneira bonita e simples de se descrever uma história sobre a oportunidade humilde que todos temos de ser felizes.
    Isto dava uma boa animação - curta metragem.

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  3. uoh thanks...2 brutos elogios, e vindo de ti maiores ainda. não que vivas numa posição de criticar tudo e mais alguma coisa, mas dadas as tuas "características" (e entenda-se características daí...não é de todo pejurativo) torna-os maiores ainda. obrigado ;)

    se bem que tu, a meu ver, estás 7674594785 patamares acima.

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