sábado, 11 de dezembro de 2010

(a)pesar

Ela estava ali, sentada numa velha cadeira de buínho com os braços mortos numa mesa de pedra à espera. Olhava para o relógio poeirento de madeira pendurado na parede gasta e caiada, olhava para a D. Alzira debaixo da chaminé entretida em panelas de barro mascarradas a borbulharem como todas as manhãs, olhava para a janela que, embora embaciada, deixava ver um verde gritante do pequeno pátio, e continuava à espera. Esqueceu-se do frio que lhe fazia pingar o nariz absorta na ansiedade. A velha porta de tábuas grossas gemeu ao abrir. Um homem de vestes gastas e sujas entra e limita-se a entregar-lhe uma carta e sair, sem balbuciar sequer. Rasga o envelope impaciente e abre-a. Estranhamente o papel não vinha escrito a esferográfica com aquela letra fluída habitual. Desta vez trazia uma folha mais grossa, com a imagem do exército ao canto, escrita à máquina e com cunho no final. Começou a ler:

É com o maior pesar que a informamos…

E parou. Parou de ler. Parou de respirar. Tentou continuar e a cada palavra que lia o coração era-lhe arrancado e desfeito aos bocados. Estava estática, cheia de lágrimas. Olhou em frente e a D. Alzira parara. Tal como o relógio. E o verde que a janela não deixava esconder desaparecera.

3 comentários: